Texto por Denise de Oliveira Milbradt
A igualdade de direitos e acessibilidade em todos os setores da sociedade é prevista em lei. Segundo a Constituição Federal em seu Artigo 5º “é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a legislação estabelecer”. Na prática são muitas as barreiras a serem vencidas para que um deficiente consiga ser inserido no competitivo mercado de trabalho. São programas institucionais para sensibilizar funcionários, adequações físicas e treinamentos para o exercício da nova função. Mas, o preconceito nos corredores e da própria família dificultam os que buscam um lugar ao sol. Deficiência não é impeditivo funcional e intelectual e, sim, um motivo a mais para aprender.
Aos 28 anos e em sua sétima experiência profissional, Débora Eva Cruz Silva esbarra na limitação imposta pelo atrofiamento do braço e perna esquerda. A dificuldade para se locomover, no entanto, não a impede de exercer com primazia a sua função no departamento de empacotamento numa grande empresa do setor alimentício na Região do Vale do Rio Gravataí. Ela recorda que os cerca de 40 colegas do setor chegaram a duvidar que fosse capaz de fazer o trabalho. O preconceito sofrido por sua deficiência física nunca a desanimou e os tempos ruins passaram. “Aprendi só observando e provei que sou tão capaz, quanto qualquer um deles”, gaba-se.
A gestora de Recursos Humanos da empresa onde Débora trabalha, Raquel Meister Hubner Chery explica que hoje conta com 224 funcionários, destes 7 são deficientes. Para inseri-los a equipe passa antes por momentos de integração e recebe orientações de segurança, boas práticas de fabricação e de condutas internas. Nos primeiros meses ainda são acompanhados pelas chefias de departamento, da consultoria que os indica para a vaga e também pelo próprio RH. O objetivo, segundo Raquel, é garantir que a adaptação seja a melhor possível para o trabalhador.
Inicialmente, conforme ela, uma das maiores dificuldades para a integração da pessoa deficiente é conseguir provar a sua produtividade. Muitas vezes são necessárias também adaptações ao processo e a compreensão com relação ao ritmo do serviço. “A cada nova integração de pessoa com deficiência, todo o setor recebe um treinamento de sensibilização sobre aquela contratação especificamente”, detalha.
Quanto às estruturas físicas, a gestora explica que foram realizadas adequações para facilitar a acessibilidade. Na lista está à redução da altura do relógio-ponto, do interfone, além do vestiário e banheiros. A médio e longo prazo está previsto a construção de rampas de acesso e adequação da estrutura física dos banheiros para cadeirantes.
Lei de Cotas obriga a contratação
A partir da Lei de Cotas 8.213/91 as empresas com cem ou mais empregados precisam preencher uma parcela de seus cargos com pessoas com deficiência. A legislação prevê ainda que os estabelecimentos precisam passar antes por reformulações em suas estruturas a fim de que a mobilidade seja facilitada, além da própria cultura e valores coletivos. Mas não é o que acontece na prática em muitos lugares, que percebem a contratação como mera imposição da lei. Os empecilhos funcionais são as maiores barreiras, cujos funcionários deficientes tendem a demorar a provar sua capacitação para a função em que foram delegados.
Com o intuito de estreitar essas barreiras e ainda identificar vagas e funções em potencial para serem exercidas por pessoas com algum tipo de deficiência, a Desenvolver oferece consultoria especializada na elaboração e implantação de projetos de inclusão desde 2007. A sua administradora, que também é especialista em psicanálise e em educação, além de gestora de projetos sociais, Marcia Cristina Figueiras Gonçalves afirma que são incluídos, em média, 200 pessoas com este perfil no mercado todos os anos. “Nossas ações inclusivas visam afirmar os direitos e deveres da pessoa com deficiência desta forma, além das ações prestadas aos clientes”, frisa.
O trabalho, conforme Marcia inicia com o mapeamento de acessibilidade do espaço, passando para a percepção de vagas. Após é feita ação de humanização para gestores, líderes de setor e demais empregados. Parte-se do princípio da igualdade, nunca da diferença. “São palestras e dinâmicas situacionais, cujas ações devem ser feitas por profissionais habilitados para propiciar ambientes divertidos e instrutivos”, relata.
Enquanto os clientes precisam cumprir um cronograma de adaptações ou adequações, a Desenvolver encarrega-se de consultar seu cadastro de currículos. São feitas entrevistas e seleções e, após a contratação, ainda acompanham a adaptação nas empresas. Quando as novas necessidades forem surgindo, outros procedimentos vão sendo orientados. “Não existe cargo para surdos, cegos ou cadeirantes, o que existe é a necessidade da empresa ter acessibilidade. Só assim a pessoa com deficiência poderá escolher sua profissão de acordo com suas habilidades. É urgente a necessidade de fazer com que percebam o seu melhor e o que pode ser aperfeiçoado”, completou Marcia.
SAIBA MAIS – A ratificação pelo Brasil da Convenção da ONU sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência e seu Protocolo Facultativo, em 2009, por meio do Decreto Legislativo 186, de 9 de julho de 2008 e do Decreto Executivo 6.949, de 25 de agosto de 2009, representou um marco na história da conquista dos direitos humanos no País, pois foi o primeiro tratado internacional de direitos humanos a ingressar no ordenamento jurídico nacional com o status de Emenda Constitucional, nos termos do §3º, do art. 5º da Constituição Federal. É a Bíblia das pessoas com deficiência e profissionais que trabalham na área.