Texto por Denise de Oliveira Milbradt | Fotos Divulgação
O comportamento em sociedade estampado no reality show da vida real. Ser feliz está minimamente relacionado ao número de curtidas ou compartilhamentos do último selfie. No Instagran existe até uma espécie de ‘máfia’ para a compra de likes. Não basta ir ao restaurante badalado, é preciso divulgar nas redes sociais. Aliás, nelas é permitido quase tudo. 24 horas de conexão ininterrupta, seja via computador, tabletes ou celulares, para as mais diversas necessidades. O exagero em mostrar o que se faz, o que se ama e o que se odeia é característica da cultura da vaidade e da sociedade do espetáculo, além de expor a insegurança inerente às pessoas.
Mas, a hiperconectividade está na mira de alguns estudiosos da área da psicologia, que enxergam o exagero do seu uso um vício sem precedentes. 2015 têm como desafio propor alternativas para que as pessoas consigam se desligar, senão totalmente, pelo menos por algumas horas. Afinal, não se questiona a utilidade dessas ferramentas para agilizar a comunicação tão em voga na vida moderna, mas sim o exagero de sua utilização.
Em várias partes do mundo disseminam-se inúmeras reflexões e movimentos contrários ao excesso do uso da internet. Aos poucos se multiplicam invenções e estratégias para fugir das redes sociais, evitar o smartphone ou mesmo se libertar da avalanche de informações divulgadas a todo instante. São restaurantes que, propositalmente, não oferecem conexão wi-fi, passando por terapias como a yoga e até excêntricos iglus de feltro – cabanas que permitem às pessoas fugirem da agitação dentro da própria casa.
Tirar o celular do bolso para checar as atualizações entre uma rodada e outra na mesa do bar, postar em tempo real a foto da viagem de férias ou até mesmo verificar a caixa de e-mails minuto a minuto são atitudes recorrentes aos usuários dessas mídias. Por mais paradoxal que pareça, os aparelhos criados para agilizar a comunicação estão distanciando as pessoas. Há um alto nível de alienação, hábitos como sentar-se à mesa na hora do jantar ou de se reunir na sala para conversar são cada vez mais raros.
Embora pareça um tanto natural e até apropriado se comportar assim em uma época em que é preciso estar online para se integrar, especialistas garantem: se desconectar de vez em quando pode garantir plenitude e mais qualidade de vida. A psicóloga Eveline Juswiak, sempre atenta às novas realidades sociais que possam interferir na área da educação mental, explica que os maiores prejudicados com o exagero do uso da tecnologia é a geração Z, ou seja, os nascidos em meados da década de 80. “São pessoas que estão conectadas em tempo integral e não conhecem a vida de outra forma. Chegam, em alguns casos, a manter relações somente no mundo virtual. Sentem dificuldades para estudar e executar qualquer outra tarefa comum”, detalha.
Esse tipo de comportamento, na opinião da especialista, além de nocivo à saúde faz com que a pessoa acabe vivendo um mundo recortado de acordo com seus desejos e opiniões. O cidadão tende a ter dificuldades para se relacionar com as pessoas afetivamente e profissionalmente. “Você não poderá mandar um SMS ou um WhatsApp para a sua chefia ou mesmo na hora de delegar funções. Um abraço e uma conversa cara-a-cara com seus pais não pode ser substituído por nenhuma ferramenta disponível na internet. São nestes momentos que devemos questionar o que estamos deixando de lado para estar teclando”, frisa.
Eveline acredita que a superficialidade, típica da vida moderna, também acabe por estimular ainda mais a hiperconectividade. No mundo online não há espaço para a timidez, todos são belos, bem sucedidos e felizes em todas as áreas. Mas, criar uma vida fictícia trás consequências desastrosas, como depressão, isolamento social, obesidade pela falta de mobilidade, dentre outros agravantes.
Além disso, os vínculos afetivos criados nas mídias sociais são diferentes daqueles construídos no contato ao vivo, segundo a psicóloga do Hospital de Clínicas da Universidade Federal do Paraná (HC/UFPR), Tania Madureira Dallalana. “O vínculo requer presença, lembrança, toque. As mídias sociais provocam uma falsa impressão de ter um contato com mil pessoas, mas sem a complexidade de emoções que o vínculo demanda”, analisa.
Terapia para ficar longe das redes sociais?
Pânico com poucos comentários e curtidas no Facebook, mensagens visualizadas e não respondidas no Whatsapp e nem 10 coraçõezinhos na foto que achou que ia explodir no Instagram. Sentiu-se mal com esses dados? Cuidado! Esses são sintomas de exagero com a imagem construída nas mídias sociais.
A psicóloga aconselha a realização de uma autoavaliação para se perceber viciado ou não em internet. Nesse momento alguns questionamentos ainda são pertinentes: Qual a função que a internet está tendo na minha vida? O que estou deixando de fazer para estar conectado? Tenho participado de atividades em família e amigos? Consigo praticar esportes e me manter longe do celular por algumas horas? Caso tenha respondido não para todas as opções, é hora de buscar ajuda ou reduzir o tempo dedicado às atividades online.
O tratamento, de acordo com Eveline, assemelha-se ao de qualquer outro vício, a começar pela compulsão. Após, aconselha a redução aos poucos do tempo de exposição às mídias com a adoção de outros hábitos a rotina. O mais importante é estabelecer limites e fazer uso dos equipamentos para algo realmente útil. “É preciso dizer que a tecnologia também é necessária. Deixar de fazer o seu uso acarretaria um retrocesso cultural, mas é sim preciso que haja harmonia entre vida pessoal e virtual”, orienta.
A moda das selfies
2014 foi o ano delas: as selfies ou, simplesmente, os autorretratos. Pelo menos um bilhão delas foram publicadas por dia nas redes sociais em todo o mundo. O aumento dos registros também se deve ao sonho de consumo dos adolescentes, o pau de selfie, que nada mais é do que um bastão com o qual é possível colocar o celular mais distante do corpo para tirar a almejada fotografia. O produto ainda permite abusar dos ângulos, incluir toda a família e os amigos.
Um estudo do Reino Unido, envolvendo 2.071 sujeitos com idade variando entre 18 e 30 anos, revelou que, quando se trata de tirar fotografias, 39% preferiram tirar fotos de si mesmos, ao invés de seus familiares, amigos, ou ainda, os animais de estimação. Ou seja, a forma como alguém se apresenta ao mundo se tornou um elemento-chave, uma espécie de autoafirmação que tem o poder de carregar características inegavelmente egocentradas.
Dentro do mundo virtual é muito fácil se perder e criar personagens mais “interessantes” aos olhos dos outros, desde uma foto com o filtro mais bonito até frases de efeito. É nessa tendência comportamental que as selfies se tornaram uma manifestação social, que evidencia a obsessão pela aparência, somada à exibição da vida privada. O resultado está no senso autoinflado que permite às pessoas acreditarem que seus amigos ou seguidores estão, de fato, interessados em vê-los deitados na cama, almoçando, abraçando alguém ou ainda, saberem que roupa está usando.
Essa forma de narcisismo excessivo, no entanto, pode ter efeitos devastadores sobre as relações pessoais e no local de trabalho. De acordo com o mesmo estudo publicado no Reino Unido, o fenômeno selfie pode ser prejudicial para a convivência como um todo, uma vez que o compartilhamento de fotos de maneira excessiva pode, na verdade, fazer com que os pares vejam as pessoas como menos simpatia em função do exagero na autopromoção.