Prof. Saul Sastre
Diretor de Administração e Finanças do Daer
Doutorando em Administração
Nunca mais me esquecerei da experiência que tive como gestor de uma empresa pública, aliás, foram várias as lembranças, onde algumas marcaram mais e outras menos. E assim estava eu à espera do novo servidor recém nomeado no concurso. A sua presença era fundamental para melhoria do atendimento em uma área específica e toda a nossa equipe havia trabalhado arduamente para abrir essa vaga, que já estava demorando mais que o previsto para ser suprida. No dia certo, ele entra pela porta, falando pouco, com movimentos discretos e um olhar curioso, senta na nossa frente e começa a escutar…
Lembrei dessa história estudando o presenteísmo nas organizações, pois muito pior que o absenteísmo, que é quando o funcionário falta ao trabalho, o presenteísmo é quando ele está na empresa de corpo presente sem produzir. Como se diz, presença física e ausência de comprometimento.
Que me desculpe aqueles servidores por vocação, que levam seus setores nas costas, mas na empresa pública talvez seja o lugar onde o presenteísmo esteja mais presente. Quem conhece um órgão público por dentro, sabe bem que o prêmio para quem trabalha é trabalhar mais e o prêmio para quem não trabalha é cada vez fazer menos atividades. Os prêmios de trabalhar mais ou menos é um fenômeno oriundo da liderança que, para poder ter resultados positivos, distribui as atividades de acordo com o comportamento das pessoas, logo, quem trabalha, acaba trabalhando mais e fazendo a diferença e quem não trabalha, acaba trabalhando menos ainda. Por isso, para separar os presentes e os só de corpo presente, basta identificar quem está sobrecarregado de atividades e quem está quase sem fazer nada.
Muitos presenteístas se apresentam assim desde quando passam no concurso, que já é um sistema falho de seleção, pois não avalia a atitude das pessoas, como assim ocorre na empresa privada. Porém, a maioria, perde o gás pelo caminho, muito pela falta de chefias preparadas para desafiar as pessoas e também pela falta de um sistema meritocrático, que premia aqueles que fazem diferença, o que acarreta um nivelamento de todo mundo por baixo, incentivando o trabalho apenas pela presença. E outros ainda, por pura falta de vocação, desses que estudam para entrar para não correr riscos, desconhecendo que serviço público é vocação e não estabilidade.
Quem passa em um concurso deve saber que a tal estabilidade no emprego, significa provavelmente nunca ser mandado embora, ter um salário certo geralmente abaixo do padrão de mercado e que é fundamental trabalhar e fazer diferença, pois aposentadoria, somente no final da carreira.
Mas voltando a história, na nossa apresentação, entre uma prova de um café e outro, intercalado com goles de água e chimarrão, começamos a conversar sobre as atividades que lhe seriam inerentes. Por estratégia, a cada palavra elevávamos o grau de comprometimento que esse neófito servidor teria que ter para com sua nova atividade. Ele escutava quieto, mas sua atitude demonstrava desconforto, não pela complexidade do ofício, mas pelo comprometimento que teria que ter para atingir o resultado esperado. De repente, sem pestanejar, lança ao vento suas palavras: “Se estiver nas minhas atribuições, dentro do meu ritmo de trabalho e eu entender necessário, farei”. Não preciso dizer que começara aí uma série de problemas e desafios. Com o tempo, a realidade comprovou que aquele concurso havia trazido mais um presenteísta, pré-aposentado, sem vocação e sem intenção de fazer diferença alguma, desses que acaba se tornando um entrave no desenvolvimento do país.