| Rosane Castro
Escritora e Narradora de Histórias
A história começa na Calábria, região que se localiza na ponta da península italiana. É a partir desse local que inicia a trajetória de vida de seis irmãos da família Ferraro, que viajaram em um navio durante vinte e nove dias, de Gênova, na Itália, até o porto de Santos, no Brasil. Os tempos eram difíceis, chegaram ao País em meados de 1953. A guerra havia afastado a família, mas a esperança os unia novamente.
O pai veio primeiro e, depois de alguns anos, vieram a mãe e os filhos: Josep (1937), Anunciata (1939), Dora (1940), Ida (1942), Teresina (1945) e Lina (1947). Todos, exceto Dora, que faleceu 2005, moram em Porto Alegre. Recentemente, precisei comprar uma peruca. Depois de muitos anos, fui convidada a atuar como atriz em um aniversário de quinze anos. Uma experiência incrível, pois exigiu a criação de uma personagem. Automaticamente, lembrei da loja Porto Presentes, que se localiza na Rua Senhor dos Passos, no centro da capital gaúcha. Fui até lá e, para minha surpresa, as três irmãs continuam a atender os seus clientes com a vitalidade de sempre. Eu as conheci há dezessete anos atrás, quando ainda trabalhava na ACO – Associação Cultural de Oficineiros. Sempre que precisava de figurinos ou adereços para teatro, recorria as “meninas”. Elas têm loja no mesmo local há dezoito anos. Trabalham em média doze horas por dia. Sobem e descem escadas o dia inteiro. Ser atendida por elas é um privilégio, pois além de receberem bem seus clientes, elas possuem uma energia incrível. Muito atenciosas, simpáticas e sorridentes.
Anunciata, a mais experiente, do alto de seus oitenta anos, movimenta-se pela loja com muita agilidade. Ida e Teresina não ficam para trás, estão sempre em movimento e conectadas a todas as pessoas que entram na loja a procura de um presente.
Nós sabemos que elas são exceção, em um País que tem um serviço público de saúde frágil e que possui uma aposentadoria que não condiz com as necessidades dos mais idosos. É certo que a expectativa de vida no Brasil aumentou para oitenta anos as mulheres e setenta e três os homens, aproximadamente (dados do IBGE de 2018), porém, temos que levar em conta a realidade da maioria das pessoas dessa faixa etária que, muitas vezes, não possuem um atendimento adequado e que ficam a margem de políticas públicas que as valorizem.
A família Ferraro veio para o Brasil quando a Itália vivia um momento delicado. Devido o pós-guerra, os italianos passavam por uma crise econômica afetada pela Guerra Fria. Eles vieram com a coragem e com a perseverança de quem encontra um ponto de luz em meio a escuridão.
Quero chegar aos oitenta anos com vitalidade, sentindo-me valorizada no País em que nasci. E, assim, termina essa história sem fim, onde somos personagens na construção de um Brasil ideal, onde todos sejamos valorizados e acolhidos com dignidade, independente da idade.