| Por Aline Peterson
Professora de Inglês e Português e
Mestre na área de Literatura Comparada
Her, filme de 2013, foi escrito, dirigido e produzido pelo estadunidense Spike Jonze, conhecido pela realização de vídeos musicais e pela atuação em filmes como The Wolf of Wall Street. O filme recebeu três indicações ao Globo de Ouro: Melhor Filme, Melhor Roteiro e Melhor Ator, vencendo o de Melhor Roteiro. Também recebeu cinco indicações ao Oscar, vencendo o de melhor roteiro. O filme mistura os gêneros drama, romance e ficção científica, e o resultado é uma brilhante narrativa que nos faz pensar a respeito das novas configurações do amor e os tipos de relação que somos capazes de manter sob os riscos da intimidade no mundo moderno.
O filme traz Joaquin Phoenix como Theodore, um escritor que se encontra sozinho após um doloroso divórcio, e Scarlett Johansson como o sistema operacional Samantha. Theodore trabalha escrevendo cartas pessoais para desconhecidos, um dos indícios da impessoalidade existente nas relações modernas. Emotivo e solitário, ele recorre a um sistema operacional, que seria, em um futuro não muito distante, uma maneira de substituir um amigo ou um companheiro amoroso, já que as pessoas se distanciam cada vez mais, tornando as relações interpessoais cada vez mais raras, ao menos as verdadeiras. No filme, reflexo da vida e da essência humana, relações se tornam eventuais e cada vez mais insignificantes. O lugar onde a narrativa acontece já é, em si, impessoal. Prédios que poderiam pertencer a qualquer lugar, pessoas sem qualquer característica física que determine sua identidade. Nesse futuro, não é a alta tecnologia que se sobressai, e sim o individualismo e um descontentamento nítido, submerso em uma melancolia que é sentida inclusive na doce trilha sonora.
É nesse universo que Samantha e Theodore nos oferecem a possibilidade de amor, ainda que seja o amor entre um homem e uma máquina. Mesmo existindo de maneira tão singular na vida de Theodore, a presença de Samantha é tão cheia de poder que leva os dois a se apaixonarem um pelo outro. Ante essa presença, Theodore aos poucos se modifica, e junto com ele uma atmosfera de otimismo e euforia promovida pelo amor dos dois começa a dominar a história. A conexão entre eles é indiscutível. Samantha está se descobrindo, Theodore, se redescobrindo. Apesar na inexistência dela como ser humano, da impossibilidade de contato físico, a existência e proximidade dela são claras, e isso se fortalece em face de sua inesperada “humanidade”. Entre o lugar escuro e cintilante, onde Samantha diz se encontrar, bem distante de Theodore, durante uma linda cena onde ela canta enquanto ele toca violão, em uma sintonia que só duas pessoas muito apaixonadas têm a oportunidade de vivenciar, até o mundo “real” de Theodore, há um lugar onde o amor se encontra. E, suponho, é ali que todos gostaríamos de estar.