Texto e foto por Kamyla jardim
Chamada pelos próprios pichadores de “detona”, as pichações não chegam a explodir edificações, mas abalam as estruturas da cultura e limpeza das cidades, desconstruindo a harmonia das fachadas e ditando novos donos do local.
Em muitas cidades e, até, em outros países, a pichação é reconhecida por seu engajamento político, utilizada como forma de expressão. Frases compõem muros com o intuito de despertar um movimento político social. Esta prática teve uma grande evolução após a Segunda Guerra Mundial, quando foi iniciada a produção de materiais em aerosol. Assim, tintas de spray podiam deixar tudo mais rápido e fácil para aqueles que costumavam pichar. Durante a revolta estudantil de Paris, por exemplo, os gritos de liberdade dos estudantes eram também passados para os muros com a pichação, garantindo que as pessoas lessem e pensassem sobre as propostas dos revolucionários. A ideia dos estudantes foi difundida pelo mundo, tanto que a escrita nos muros era totalmente intolerada durante os anos de ditadura militar brasileira, nos quais era banida qualquer liberdade de expressão.
Cachoeirinha é um dos municípios com maior índice de pichação no Rio Grande do Sul. Velhos e novos prédios, estabelecimentos ou muros já apresentam a tinta dos pichadores. Entretanto, não são as pichações históricas, com contextos políticos sociais, e sim, aquelas que têm uma única função: marcar território. Os moradores de Cachoeirinha e comerciantes buscam alternativas para impedir a ação dos pichadores, entretanto as soluções existentes são caras e, na maioria das vezes, fogem dos orçamentos previstos para as obras dos estabelecimentos. Além do comércio e áreas residencias, os pichadores desrespeitam também monumentos e prédios públicos, tirando totalmente a beleza e a vida da cidade.
Atualmente, as pichações são consideradas vandalismo, pois não têm o objetivo de serem avaliadas como arte. A prática é uma rivalidade entre grupos que demarcam o território e competem entre si para ver qual pichador será mais destemido ao marcar lugares cada vez mais inatingíveis e altos.
No Brasil, vigora uma lei que estipula pena de detenção de três meses a um ano e multa para quem pichar edificação ou monumento urbano. Todavia, muitos juízes vêm adotando a aplicação de penas alternativas, como o fornecimento de cestas básicas a entidades filantrópicas ou a prestação de serviços comunitários pelo infrator. Em Porto Alegre, por outro lado, policiais procuram enquadrar os pichadores também em formação de quadrilha, possibilitando penas maiores.
De acordo com o secretário de Planejamento e Gestão, Charlante Stuart, não há uma fiscalização específica para pichadores por parte da Prefeitura em Cachoeirinha: “A Guarda Municipal faz ronda em locais específicos, normalmente vigiando patrimônios públicos, e não temos tido pichações nestes locais”, afirma. O secretário de Segurança, Acácio Batista Ramos, complementa, explicando que a função da Guarda Municipal é vigiar os prédios e praças públicas, porém não tem o poder de prender nenhum infrator. “Quando a Guarda Municipal se depara com pichadores é feito a revista, a apreensão dos materiais utilizados na pichação e o contato com a Brigada Militar, para que, estes sim, encaminhem a situação da forma correta”, ressalta o secretário Acácio.
Quando os pichadores são pegos no ato do crime pela Brigada Militar, eles são automaticamente presos em flagrante, conforme relata o Capitão Douglas Rossato: “É confeccionado um termo circunstanciado e o preso é liberado. Após isso, a documentação é encaminhada ao judiciário para que o magistrado de o devido destino ao processo”.
Sobre alternativas de fiscalização, o secretário de segurança destaca que tanto a Prefeitura, quanto a Brigada Militar têm acesso ao que as câmeras de vigilância do município captam e que elas auxiliam extremamente no trabalho contra a criminalidade. “A pichação não provem de falhas na fiscalização, ela é um problema cultural e as formas para reverter essa situação são ações sociais e culturais”, afirma Acácio Ramos.
Tanto o capitão Rossato quanto o secretário Charlante compartilham da opinião de Acácio e a secretaria da Cultura de Cachoeirinha também não pensa diferente: “Nós sabemos que para acabar com a pichação é preciso de um resgate social, de maior investimento na cultura e educação destes jovens”, afirma Nerisson Oliveira, secretário da Cultura.
Uma das formas de reverter a situação é disponibilizar oficinas de grafite, transformando esse indivíduo, que se encontra no vandalismo da pichação, em artista de rua e também em um profissional. “A maioria dos pichadores têm o dom da arte, mas não sabem como usá-lo e acabam utilizando a pichação como passatempo, sem perceberem que poderiam até ganhar dinheiro com a arte. Quando precisamos de verdadeiros grafiteiros para um trabalho artístico específico, nós temos que buscar em outras cidades, porque em Cachoeirinha não encontramos, então a ideia é formar os nossos grafiteiros e retirar esses jovens da marginalidade”, explica Sônia Maria Zanchetta, diretora da cultura.
A Prefeitura está iniciando uma parceria com a Associação 4 elementos da Cultura Hip Hop, que além da música e dança, também desenvolve trabalhos com o grafite. Para o próximo ano, a semana do Hip Hop já está confirmada em Cachoeirinha e faz parte do cronograma do evento oficinas e palestras sobre o grafite. Além disso, Nerisson afirma que a Prefeitura tem investido muito em outras opções de cultura, lazer e esporte: “Praticamente todas as quadras do Parcão serão refeitas e também vamos investir na quadra de basquete e na instalação de espaços e aparelhos para ginástica”. Sônia explica que todo esse investimento é para proporcionar atividades e outros interesses aos jovens, pois como destaca: “Na medida em que a cabeça é ocupada com cultura, o vandalismo perde seu espaço na sociedade”.
Que as medidas tomadas de conscientização dos pichadores surtam efeito, pois além de retirar a beleza da cidade e prejudicar muitos proprietários de estabelecimentos, a pichação é o caminho para a violência, para as drogas e para outras criminalidades.
Arte na rua
Grafite é uma forma de expressão, muitas vezes não confundida com a pichação. Suas primeiras aparições foram no Império Romano, onde homens da caverna faziam desenhos (símbolos) – chamadas pinturas rupestres – basicamente para a comunicação. Elas representavam caçadores, animais e alguns outros símbolos cujos significados não são conhecidos por nós hoje em dia.
Este tipo de arte compõe atualmente parte do visual urbano. Na Idade Contemporânea surgiu com mais força na década de 70, em Nova Iorque, quando jovens de vários estilos, mas principalmente o Hip Hop, expressavam suas ideias oprimidas na época.
No Brasil, o grafite chegou ao final da década de 70. Brasileiros, não contentes com o estilo nova-iorquino, completaram com seu próprio jeitinho, fazendo com que o grafite brasileiro se destacasse em relação aos de outros lugares do mundo, sendo hoje considerado um dos melhores.
O grafite possui uma preocupação estética e deixa marcas muito bonitas pela cidade. É considerada a arte da minoria que tentam divulgar seus trabalhos fazendo belos desenhos nos muros.
Arte na Praça da Juventude
No dia 3 de agosto foi inaugurada a Praça da Juventude, no bairro Granja Esperança, em Cachoeirinha. O Espaço conta com campo de futebol, quadra poliesportiva coberta, anfiteatro, biblioteca, estacionamento e banheiros. Com o objetivo de promover o grafite, a Prefeitura contratou dois profissionais da arte de Canoas para ilustrarem o seu trabalho nos muros da Praça. Desta forma, os muros não sofrerão pichações e ainda servirão de positiva inspiração artística para os pichadores da região.