Por Aline Peterson
Professora de Inglês e Português e estudante de Mestrado na área de Literatura Comparada
American Beauty (Beleza Americana) é um filme norte-americano de Sam Mendes realizado em 1999, que tem como elenco Kevin Spacey, no papel de Lester Burnham; Annette Bening, que vive sua esposa Carolyn e Thora Birch, que interpreta Jane, a filha desse típico casal americano. Sam Mendes pensou em Spacey e Bening para os papéis principais desde o início, porém, a DreamWorks Studios sugeriu outras alternativas, como Bruce Willis, Kevin Costner ou John Travolta para Lester, e Holly Hunter ou Helen Hunt para Carolyn. No entanto, Mendes não queria grandes astros do cinema, pois, segundo ele, isso desviaria o foco do filme.
A atuação de Kevin Spacey lhe trouxe o Oscar de melhor ator. Além disso, o filme também conquistou outras quatro premiações: melhor filme, melhor diretor, melhor roteiro original e melhor fotografia. Lester Burnham é o protagonista, um homem no meio de uma crise de meia idade que possui um emprego o qual odeia e é casado com uma mulher absolutamente indiferente e bastante materialista. A autenticidade do sentimento de Lester pode ser percebida pelo expectador não somente através de seus diálogos, mas também pela maneira como ele sagazmente manipula situações, com um sarcasmo nem sempre sutil. A monotonia de sua existência é realçada pela falta de cor em seu escritório e em suas roupas. Ele é frequentemente filmado como se estivesse preso, mostrado dentro de quadros, como no chuveiro, em uma das primeiras cenas do filme; ou através de barras, quando ele é refletido atrás de colunas no monitor de seu computador.
O filme ironiza claramente o modo de vida da classe média americana e seus conceitos acerca da beleza e satisfação pessoal, que é representada basicamente através do materialismo e da extrema fixação pelas aparências. No entanto, essa é uma sátira que se encaixa perfeitamente em muitos cenários, incluindo o nosso, tão focado no materialismo e na aparência quanto aquele do filme. A libertação pessoal, a qual todos nós parecemos buscar como se estivéssemos em um emaranhado de caminhos sem conseguirmos encontrar a saída, é apresentada em alguns momentos na narrativa. Esses momentos são por vezes trágicos e apresentam seus personagens no fastígio de suas vidas, em um tipo de tentativa de redenção de toda a alienação experimentada até ali, que nem sempre é conquistada. O filme argumenta contra a conformidade, e não rejeita a idéia de que as pessoas a querem. Todos parecem desejar a resignação, a aceitação.
Uma característica marcante em American Beauty é o estilo do diretor. Se olharmos o filme superficialmente, ele parece monótono, principalmente devido ao uso extensivo de planos estáticos e zooms. Do início até aproximadamente a metade do filme, ainda não sabemos ao certo quem é o protagonista, ora nos parece ser o pai, Lester; ora a filha, Jane, podendo nos dar a impressão de ser um filme sem sentido e sem foco. No entanto, é justamente essa lentidão que oferece toda a tensão que o filme proporciona, pois essa pacificidade nos planos contrasta com eventos conturbados apresentados na tela. É como se nada pudéssemos fazer para controlar e nos eximir de toda a beleza sem sentido que nos circunda.
Além de o filme conter várias histórias, que juntas dão todo um sentido para essa crítica às aparências que tentamos manter, os personagens são fundamentais para que essa crítica se construa. O filho do vizinho, que passa quase que o filme inteiro com uma câmera, filmando tudo o que pode, mesmo aquilo que não nos parece interessante, apresenta um possível indício no filme: de que precisamos olhar através de outros olhos as coisas simples para enxergar a real beleza delas. A cena da sacola de plástico nos mostra clara e explicitamente isso.
Outra personagem, que é substancial no filme, é Angela, interpretada por Mena Suvari. Ela é tão substancial que, por vezes, achamos que ela é quem é a protagonista, já que é ela quem desencadeia muitas das tensões no centro daquela família tão aparentemente tradicional. De qualquer modo, ela é a representação da beleza de muitas formas possíveis, evidenciando a importância e a confusão que a mera imagem, tão superficial, pode causar àqueles que olham apenas para o que é facilmente visível. Por fim, a beleza já não é mais protagonista de nada, mas apenas um desvio de foco o qual todos pensamos necessitar para esquecer o trágico que há em nossas vidas.